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quinta-feira, 15 de julho de 2010

A VOZ DE MINHA MÃE NA COZINHA


Existem passagens em nossa vida que parecem fadadas a perpetuarem-se. São ícones da eternidade que arremessados pela vida o nosso coração recolhe e guarda em seu cofre mágico, cheio do perfume nostálgico da recordação. Uma dessas passagens nasceu quando eu tinha por volta dos oito anos anos de idade.

A madrugada parecia tecida de sombras assustadoras. Abri os olhos e em volta, antes de perceber meus irmãos que dormiam quase amontoados naquele quarto de razoável proporção, apenas senti o breu, que parecia gélido e ameaçador. Precisava enfrentá-lo, porem. Quem me incentivava a tal odisséia era a bexiga cheia de urina e prestes a explodir (por favor, não riam).

O sanitário encontrava- se ali, cerca de dez metros, se muito, das minhas pretenções. Suspirei fundo e fui me levantando devagar. Seria capaz, sim, de enfrentar a escuridão e seus fantasmas( como veem, já existiam fantasmas à minha volta,rsrsrsr). Mas ao olhar de soslaio, lá pelo cantinho do olho, em direção à porta do quarto, deparei-me com uma das imagens mais ameaçadoras da minha vida: um moreno, de cerca de um metro e sessenta, estava ali, parado e olhando em minha direção. Deitei-me num gesto automático e com o coração acelerado. A taquicardia me assustava mais ainda pois acreditava que o intruso podia escutar a batidada desesperada do relógio cardíaco.

Arrepiado e coberto pelo lençól, criança assustada, sentindo o calor daquela madrugada de verão, sem nem mesmo um ventilador, era a imagem da angústia e do desespero. Quase paralizado pela presença do ser que eu não sabia se era um ladrão ou um dos fantasmas da escuridão, olhava, vez em quando, pela brecha do lençol, se a ameaça ainda estava ali, na entrada do meu quarto. E para meu desespero, ele não saía de lá. Não se mexia. Parecia um cruel perseguidor de pobres crianças como eu, tão frio era seu coração, que não se movia.

Foram cerca de cinquenta minutos de pavor. A cama já se encontrava toda molhada de suor e da urina quando adormeci vencido pelo cansaço. Despertei ainda um tanto assustado bem cedinho. Havia os belos raios de sol clareando a sala e o quarto. E a voz querida e doce de minha mãe cantando na cozinha. Nunca uma voz me pareceu, até hoje, tão salvadora como a de minha mãe, após aquela madrugada em que um triste habitante das sombras desejou me matar de medo. Me levantei mais apaixonado pela minha mãe que nunca. Mas ao olhar para a porta aberta do meu quarto percebi que o intruso ainda estava lá, desafiando meu lar, minha poderosa mãe e minha resistencia. Era manhã, no entanto, e minha mãe estava ali, bem pertinho, com sua veludosa( nem tanto) voz a me proteger. Resolvi encarar a ameaça. E vi, constrangido, que não era qualquer fantasma e muito menos um ladrão, emburrecido e petrificado na porta do meu quarto. Era o paletó do meu pai pendurado na cadeira da sala. Uma ilusão de ótica da escuridão.

O que me marcou mais no acontecido dos meus oito anos não foi tanto o constrangimento da descoberta do paletó. Claro que alem do pavor da madrugada, da taquicardia e do xixi na cama, era a figura tranquilizadora, protetora, da mulher que me recebeu para uma nova encarnação. Até hoje me comove o quanto de serenidade ela me transmitiu naquela fatídica manhã, em que uma dos mais duros fantasmas da madrugada ameaçou minha segurança. Ao chegar à cozinha, fiquei olhando o rosto lindo de dona Terezinha e sorri quando seus olhos amenos me olharam, dando-me bom dia antes da boca. Ela estava mais linda que antes. E sei que ela deve ter achado estranho minha expressão embevecida e a hora tão cedo, naquele domingo de descanso.

Bom, hoje, na espiritualidade, ela já deve saber como me salvou do terrível monstro...só não foi capaz de impedir o suor desesperado e o xixi na cama.

8 comentários:

  1. Fred, ontem eu está tão emocionada, e feliz, que nem tive como me despidir e agradecer.

    Muito obrigada, ontem foi incrivel.

    Obrigada

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  2. Fred! Fred! Haaa! essas lembranças da infancia...rs rs rs.. ♥

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  3. Fred, os personagens mudam mas as situacoes sao as mesmas... as maravilhosas lembrancas da infancia e do carinho de nossas maes nos momentos dificeis!!! Valorizamos ainda mais quando temos nossos filhos...

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  4. Fred,

    Não adianta pedir para não dar risada. (kkkkkkkkkkkkkkkkk)

    E que texto lindo, que recordação doce de sua mãe...
    Deus te ilumine sempre!

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  5. Fred, vc foi, é e sempre será uma resenha.


    Beijos e abraços para vc e Luciana!

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  6. Poxa, Fred, adorei essa historinha!

    Linda, meiga, doce e cômica, assim como tu és!

    Beijos com muito carinho!

    Susie.

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  7. OLHA, É IMPOSSIVEL, COM TODO RESPEITO, LER E NAO RI....SUGESTAO..... QDO NAS SUAS PALESTRAS O PUBLICO ESTIVER CHORANDO, CONTE ESSA HISTORIA, É UMA BELA HISTORIA....
    SO VC MESMO....MARAVILHOSO.
    ABRAÇO.
    FICA COM DEUS

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  8. Nesta madrugada (25/04), em que me coração teima em não se aquietar, achei de ler justo essa postagem...rs rs rs rs. Amei, meu amigo!

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